Latest Blog Post
“Entre Parênteses”
Não sei bem quando começou, mas reparei num padrão curioso. Mulheres mais jovens aproximam-se com curiosidade — aquele brilho nos olhos de quem tropeçou numa história inesperada — mas hesitam logo depois. Como se a minha presença, primeiro leve, se tornasse pesada ao perceberem o que trago comigo: tempo. E história.
Não é o cabelo grisalho. Já me disseram que até tem charme. Nem os sinais do corpo, que o espelho insiste em salientar — esses, a idade ensinou-me a encarar com humor. Talvez seja outra coisa. O receio de entrar numa narrativa que já vem com capítulos escritos. Ou, pior, de não conseguir reescrevê-la ao seu jeito.
Trago vírgulas, travessões e memórias que não se dobram a novas versões. Não sou página em branco, mas ainda tenho espaço por preencher. E há quem prefira livros sem passado — mesmo que o final esteja longe.
Algumas olham para mim como se eu fosse um intervalo entre histórias. Uma música de fundo enquanto decidem o próximo refrão. Eu entendo. A vida ensinou-as a procurar futuros em biografias curtas e peles lisas. Já eu aprendi a valorizar os silêncios. O olhar que diz mais que a promessa.
O que me intriga não é o medo delas de mim — é o medo que têm de si mesmas quando se aproximam. Como se a proximidade com alguém que já caiu e voltou a levantar as obrigasse a olhar para dentro.
Não procuro salvar ninguém, nem ser salvo. Já não espero que me reinventem, nem quero ser mapa para quem ainda não sabe o destino. Mas gostava que entendessem que o meu passado apenas existe, sem competir com o que quer que seja — como um bom disco em vinil: com riscos, com ruído, mas ainda tocável.
Cada um dança ao seu ritmo. Mas se um dia quiserem sentar-se à mesa, sem medo de onde isso leva — eu continuo por aqui. Copo meio cheio. Música a tocar e muito possivelmente atrás do balcão da Tasquinha...
Posted 4/22/2025, 5:00 PM