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Eu nunca soube dizer se foram os meus pés que se moveram primeiro ou se foi o vazio entre nós que me empurrou. Ela não precisou de palavras — nunca precisou. Seus silêncios eram pontes que desabavam sob meus passos, rios congelados que me obrigavam a recuar.

Eu tentava, sabe? Segurava sua mão no escuro, contava as estrelas pelo buraco no telhado, inventava histórias sobre um futuro que parecia sempre fugir pelo ralo da pia. Mas ela respondia com ausências. Com olhares que escorriam pelas paredes, como tinta molhada.

“Fica,” eu queria gritar, mas a voz secava na garganta. Como pedir que alguém ouça o que você nem ousa sussurrar? Ela me ensinou que o amor também pode ser uma cela. As grades não eram feitas de ferro, mas de minutos inteiros em que ela virava o rosto, de noites em que o único som era o eco do meu próprio respirar. Eu me tornei um estranho em meu próprio quarto, um espectro que ela atravessava sem pestanejar.

No dia em que arrumei as malas, ela estava sentada no sofá, imóvel, como uma estátua de sal. Acredito que, se eu tivesse tocado seu ombro naquele instante, ela teria desmoronado em mil partículas de poeira. Mas eu já não sabia mais como tocá-la. Seus silêncios haviam cavado um abismo onde antes existiam meus dedos entrelaçados nos dela.

Agora, caminho por ruas que não me reconhecem, carregando uma mala leve de roupas e pesada de perguntas. Será que um dia entenderei o que ela quis dizer calando? Será que, em algum lugar entre os não-ditos, existiu um “não vá” que eu não soube decifrar?

Deixo a cidade para trás, mas levo seu nome preso entre os dentes, como um segredo que não ousa ser revelado. E mesmo sabendo que nunca volte, ainda me pego ouvindo o eco de um adeus que nenhum de nós pronunciou. Talvez o amor dela sempre tenha sido isso: um idioma mudo, onde permanecer significava desaparecer.

E eu... eu só não soube ser fantasma.